LIVROS | ECOLOGIA, JOANA BÉRTHOLO

Ecologia é o melhor livro que já li. 

Porque tem tantas coisas lá dentro. Tem tantas camadas, tantos mundos. 

Porque me surpreendeu tanto, por ser tão diferente, inovador e bem construído. 

É tão denso de ideias que dá a sensação que quase que não  importam muito as personagens, na minha leitura (apesar de ele ter boas personagens). Vejo-as como veículo para as constantes reflexões que este livro quer fazer com o leitor. 

Ecologia é, num só livro, uma distopia, uma sátira, um livro científico, um livro com humor, um livro poético  e um romance. 

[ Aqui encontram pensamentos e conversas sobre a origem da língua, das palavras, as teorias da linguagem, questões, hipóteses, coerência e incoerências. Ideia nunca antes imaginadas pelo leitor. 

Em volta disto, o capitalismo, o poder do dinheiro, das grandes marcas e a cegueira de todos nós, tantas vezes, perante pequenas mudanças que se tornam ideologias, filosofias, rotinas, deveres e direitos assumidos, sem oposição, sem contraditório... 

E também aqui, o Vale do Silêncio. Aqui vivem uma florista, uma filósofa, um tradutor do manuscrito de Voynich, um neurocirurgião, uma indígena e um odontologista.  

Sem dúvida que ganhei um gosto especial pela personagem Candela, uma menina curiosa e observadora das palavras e da língua. Uma menina que nasceu já num mundo diferente e que questiona aqueles que ainda viram a luz dos dias em que falar ou não falar  era uma possibilidade, uma liberdade garantida. Fascina-me esta ideia, muito presente na primeira metade do livro, de que quando somos pequenos temos uma sede enorme de perceber como tudo era antigamente, perceber as mudanças sociais, históricas, culturais, e linguísticas aqui também.

 Quero muito reler e reler este livro. Este livro é gigante!


Pedaços favoritos


(pág. 14) 

"Lugares onde te aguardam. Tarefas por completar. Esquinas por dobrar. Palavras por compreender. Tantas. (...) Respiras fundo, os olhos ainda fechados. Cada palavra te empurra para baixo, sete colchões abaixo do chão tentas voltar àquele Vale, àquela luz inclinada, àquele silêncio recto. Em lugar disso, encontras um batalhão de verbos imperativos organizados na tua direção - tens de tens de tens de tens de - a ordenar-te que sejas tu ou qualquer coisa de ti, com nódoas e bainhas descosidas, tu nem saber onde pôr as mãos (...)"



(pág. 17, sobre a criança vs adulto) 

"Um ser com qualquer idioma em potência. Invejas-lhe essa abertura, invejas tudo aquilo que ele ainda pode escolher dizer, e ser. Invejas-lhe a liberdade (...) ao olhar para ele, sentes-te velha e sem vocabulário para a frescura destas manhãs"





"dizer nada em lado nenhum sem nós escutemos "

classificação: 10/10

até breve ~  

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