LIVROS| Ensaio sobre a cegueira, José Saramago

José Saramago no Entroncamento, antes da devolução

Quando era miúda, recebia imensos livros do meu padrinho e de uma amiga antiga antiga, muito querida, da minha mãe, posso dizer, atrevo-me, minha também. 

Ela mudou-se e eu também saí de casa, nunca mais a vi e nunca mais contactamos, talvez há 15 anos... Com toda esta situação de pandemia, ela voltou para o Entroncamento, e voltou a ter mais contacto com a minha mãe. 
(curioso: quase todos os dias sei coisas dela, através das conversas com a minha mãe ao telefone, é engraçado sabe-la tão perto e não imaginar como será que ela estará, com é o seu rosto, voz...tantos anos depois; apenas a sei através de outra pessoa, uma história de uma história). 

Quando me fizeram ter vontade de ler Saramago (as intermitências e a cegueira), lembrei-me imediatamente dela. A minha memória de infância trouxe a imagem dela, uma leitora voraz, não tenho a imagem de prateleiras cheias de livros, mas a memória de saber que ela lia muito muito e que falava muito do que lia. E acertei. Pedi à minha mãe para lhe perguntar se tinha estes dois livros e tinha os dois. Pulos de alegria, incrível.  Queria muito ler As intermitências da morte, principalmente, e ela acabou por me o oferecer com dedicatória, através da minha mãe. Fiquei muito sensibilizada. Acabei por ler primeiro O ensaio sobre a cegueira, que nos emprestou, entretanto a minha mãe já tinha começado o primeiro. 

Ao contrário do costume, não fiz anotações nenhumas ao longo da leitura, fui apenas saboreando a leitura. Adorei o livro, foi um surpresa muito boa,  principalmente porque a minha última experiência  com JS , com A viagem do elefante, não passou de uma tentativa, não gostei da escrita e não consegui acompanhar nem desfrutar. 

Este é muito distinto, escrito de uma forma bonita, fluída, 'fácil', cativante - acho que é uma mensagem importante para quem já tentou ler JS e desistiu. 

Em relação ao Ensaio sobre a cegueira, para os (poucos) que não conhecem a ideia, conceito da história: é a visão de um mundo (ou país... ou distrito) que se vê cego, começa com um número pequeno de pessoas (que serão as personagens principais) e que depois, se alastra pela população, um mal branco contagiante - nesta cegueira as pessoas vêm tudo branco, como um mar de leite.

O mais genial de tudo é o uso propositado, não exagerado mas muito inteligente, de expressões tão nossas, tão portuguesas (tão humanas na verdade, porque muitas são transversais nas línguas) conectadas à visão, intrinsecamente conectadas à visão. Coisas como:

Olha ...

Vai-se a ver e ...

... bem visto ...

estás a ver?

vendo por outro lado ...

(...) outros desfaziam-se do que possuíam com uma espécie de indiferença, como se pensassem que, vistas bem as coisas, não há no mundo nada que em sentido absoluto nos pertença (...)

(...) sim, com uma condição, à primeira vista há-de parecer escandaloso que alguém anteponha condições a um favor que lhe querem fazer, mas certos velhos são assim, sobra-lhes em orgulho o que lhes vai faltando em tempo. (...)

(...) deixemos as coisas como estão, a seu tempo se verá (...)


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Se ainda não leram, espero que possa ter despertado interesse ... 
até breve ~


Comentários

Luis disse…
um blog cheio de preciosiades